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quinta-feira, 4 de abril de 2013

Cinco fatos...


"(...) Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou

E cada qual no seu canto
Em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor"
(A banda - Chico Buarque)

Dia desses um amigo me pediu para elencar os cinco fatos que seriam mais marcantes em uma vida. A pergunta era parte de uma pesquisa e em breve deveria tornar-se uma bela poesia se bem o conheço, aliás, me orgulho de ter amigos que vivem da arte, ou pelo menos reservam parte do seu dia para não deixar que ela sucumba.
Tenho amigos músicos, compositores, desenhistas, poetas, contistas, pintores, fotógrafos e aqueles que fazem arte com sua fala, sua risada e seu jeito de deixar o mundo mais colorido com um olhar diferenciado. Creio inclusive, que a característica comum a todos esses artistas seja o olhar diferenciado. Aquele olhar que vai além das aparências, que sobrepõe a primeira impressão e consegue captar sentimentos até em pedras.
Mas voltando ao desafio colocado pelo amigo poeta e desenhista, diria que me fez pensar que a vida é muito maior do que cinco fatos marcantes e que seria injusto citar um ou dois acontecimentos de forma que parecessem mais especiais que outros.
Acontece que mesmo tentando, não consegui separar apenas cinco fatos que poderia considerar os mais marcantes da minha vida. Tentei então, ampliar o horizonte e elencar cinco fatos que seriam os mais marcantes na vida de qualquer pessoa. E confesso que a tarefa mostrou-se ainda mais complicada.
Ao visionar uma vida que não era a minha cai no difícil dilema de escolher algo que nunca tinha sido vivido e não poderia ser avaliado como positivo ou não. Pensei que um fato marcante na vida de uma pessoa seria o nascimento de um filho, por exemplo, mas como poderia assegurar isso se nunca o vivi e mais, tenho relatos de amigos que afirmam categoricamente a riqueza da maternidade/paternidade e já presenciei mães rejeitar os filhos e transformar a maternidade em algo incrivelmente tenebroso.
Acho que o que acontece é que temos a mania (a terrível mania) de confundir bons momentos com desejos não realizados. Temos o costume de exaltar algo como primordial até que ele aconteça, pois depois do primeiro segundo efetivado parece que vai desgastando, perdendo a cor e o que era pra ser a realização do maior sonho do mundo, torna-se apenas mais uma conquista.
Talvez seja por isso que tive tanta dificuldade de elencar cinco fatos marcantes. Ao lembrar-me de algo incrível que já tinha vivido, logo me passava pela cabeça algo mais recente e depois algo que ainda não tinha se concretizado, mas que com certeza deveria ser uma sensação e tanto.
Vou dar um exemplo claro, quando tentei responder a pergunta nem sequer citei meu primeiro salto de paraquedas. Acontece que esse era um sonho de adolescência e tornou-se a vitória do século, até que veio o segundo salto e depois o salto de paraglyder e transformaram aquele desejo maior do mundo em apenas mais uma ação realizada. Como se saltar de paraquedas fosse como ir à padaria e pedir dois pães todos os dias.
Cheguei a criticar o amigo pesquisador dizendo que perguntas desse tipo não deveriam ter limite de resposta, por crer que cada momento, cada sensação, cada ação é única e mesmo que seja repetida, mesmo que seja novamente idealizada nunca mais será como a primeira vez. Então seria injusto e praticamente impossível comparar a entrada na faculdade com a vista do primeiro pôr-do-sol, ou a primeira grande viagem com o nascimento de um filho, por exemplo. Ter que enumerar o que seria mais ou menos marcante acarretaria em deixar buracos na colcha de retalhos que costumeiramente chamamos de vida.
Mas pensando bem, a dificuldade em elencar os fatos deu-se justamente pelo contrário. Não pelo valor que cada conquista teve, mas pela perda de seu valor após ter sido conquistada. E quando percebi isso, fiquei extremamente incomodada.
O incomodo maior surgiu porque a vida continuará sendo feita de momentos, de escolhas, de sensações e emoções, contudo pode findar-se amanhã e não ter tido valor nenhum, pois ao invés de colocar as conquistas na estante temos o péssimo costume de colocá-las embaixo da cama, na intenção de sobrar na estante mais espaço para novas conquistas. E isso não é de todo mau, o único problema é que quando não valorizamos as conquistas e focamos apenas no que ainda queremos conquistar parece que nossa vida não valeu de nada.
É como se nadasse, nadasse e morresse na praia todos os dias, já que nenhuma conquista é lembrada, nenhum esforço foi válido, nenhuma escolha fez sentido e a vida vai ficando chata, sem graça, cinza e você vai ficando desanimado, triste, chateado e o pior, atribui isso tudo a qualquer coisa menos ao real motivo.
Então, meus caros leitores e amigos, vou fazer questão de iniciar uma lista não com cinco, mas com cinco mil fatos marcantes que fazem parte da minha vida. E o verbo no presente aqui é proposital, pois não é porque já aconteceram que deixaram de ser importantes, qualquer fato é e sempre será responsável por eu ser quem sou hoje. E desses cinco mil surgirão outros cinco e mais cinco e poderão me mostrar o quanto venci, o quanto conquistei e o quanto valeu a pena todo e qualquer esforço. Que tal começar sua lista também?

Foto de: Taline Libanio.

Um comentário:

Taline Libanio disse...

Texto publicado no Jornal Democrata de São José do Rio Pardo/SP, no dia 16/03/13.

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