“Há
momentos infelizes em que a solidão e
o silêncio se tornam meios de liberdade”.
Paul Valéry
Eu adoro o silêncio. Exceto
quando ele me engole. Adoro o barulho do nada, é bom ficar no silêncio
esperando apenas o silêncio, sem a expectativa do próximo acorde. O silêncio é
de fase única, sem altos e baixos, sem agudos e graves, apenas silêncio.
Poucas pessoas admitem, algumas
não entendem e muitas não suportam a necessidade do silêncio em suas vidas. Eu
adoro gente, mais do que o silêncio inclusive. Adoro barulho, música,
movimentação, chiados, cantos, ruídos, enfim... Mas eu também adoro o silêncio,
aliás, eu preciso dele.
E é por isso que descobri que
adoro morar sozinha. No meu espaço é o único lugar do mundo onde consigo me
encontrar com o silêncio. Por mais que se escute um barulhinho ou outro, um
carro passando, uma pessoa gritando, nada é capaz de afetar o silêncio, por
vezes egoísta, que me acompanha diariamente.
Quando se mora sozinho você tem a
opção de escolher o silêncio. Você pode optar por ele todos os dias, meio
período do dia, um final de semana ou em momento algum, mas a escolha é sua. Porém,
quando se reside com outras pessoas isso se torna um pouco mais complicado,
pois mesmo quando se tem a possibilidade de fechar-se em um quarto, o silêncio
pode ser interrompido a qualquer tempo.
Eu adoro o silêncio sem
interrupções. Aquele que existe pleno e sem prazo para acabar. No meu caso não
é muito difícil mantê-lo. Não gosto de televisão, raramente ligo esse aparelho,
especialmente aos finais de semana. Não tenho TV a cabo e isso foi uma opção
racional, visto que se já reclamo da minha falta de tempo sem opções de
distração na TV, imagine com uma lista de filmes, documentários e séries a
minha disposição.
De música eu gosto, conheço
pouco, mas gosto. Por vezes coloco em uma rádio de música brasileira que escuto
pela internet ou escuto algum álbum antigo que me acompanha desde a
adolescência e quando faço isso gosto de cantar, baixinho é claro, visto que jamais
poderei ser uma cantora profissional com essa voz rouca.
Mas quando quero o silêncio eu
desligo tudo. Tiro até o telefone e o micro-ondas da tomada. Existem algumas
horas dos meus dias, em especial aos finais de semana, em que preciso do
silêncio. Adoro acordar sem pressa, sem despertador e aproveitar o silêncio da
minha casa. Ando de um cômodo ao outro, olho pela janela, observo aquele
alvoroço de gente na rua e interiorizo o silêncio.
Por vezes fico horas assim,
sentada no sofá com uma xícara de leite com chocolate nas mãos, olhando pela
janela, em silêncio, sem pensar em algo específico, sem precisar de um barulho.
Claro, que em alguns dias sinto falta de um “bom dia” logo cedo, mas a sensação
que o silêncio me provoca é maior e melhor que qualquer ausência.
Entendo quando as pessoas dizem que
precisam ficar sozinhas. E confesso que só consegui entender isso recentemente.
Não foi fácil tomar a decisão de morar sozinha, de chegar em casa e estar
sozinha, de sair de casa sozinha, de dormir sozinha, de rir e chorar sozinha,
enfim, mas foi uma escolha e hoje vejo, foi a melhor decisão.
Quando residia com minha família não
entendia quando alguém me falava que precisava ficar sozinho, que precisava de
espaço e continuei sem entender por muito tempo, mesmo depois de morar sozinha,
mas quando aprendi a conviver comigo passei a entender perfeitamente qual a
importância e o significado do silêncio na minha vida.
Às vezes é difícil encarar o
silêncio, pois ele não nos deixa outra opção além de olhar para nós mesmos. É
difícil suportar nossos defeitos, nossos erros, nossas falhas e no silêncio
tudo isso se torna muito evidente.
Mas quando se está de consciência
tranquila, feliz, cheia de paz...Ah! Como é gostoso suportar o silêncio! Na
verdade quando se tem uma tempestade na mente, um monte de barulho e problemas
para resolver, nem mesmo se estivesse no Tibet
seria possível encontrar o silêncio.
Enfim, poderia afirmar que o
silêncio é bom e que pode ensinar muita coisa, inclusive sobre
autoconhecimento, mas para que esta experiência seja digna de recordação, é
preciso primeiro aprender a silenciar os barulhos interiores. E isso, preciso
admitir, nem sempre é fácil...
Foto de: David de Oliveira Filho.
2 comentários:
Texto publicado no Jornal Democrata de São José do Rio Pardo/SP, no dia 26/05/12.
David de Oliveira Filho,obrigada por ceder a foto que ilustrou este texto.
Aguardo comentários!
Me identifiquei muito com o texto, com as sensações e a ausência delas que as vezes o silêncio traz... Realmente é uma descoberta... não dá pra receitar ou recomendar... mas descrever... e vc faz isso muito bem. Parabéns mais uma vez. bjs. Lu
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