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sábado, 21 de novembro de 2009

Vai assoprar ou não?

Era apenas mais uma dessas noites insones. Noite quente, cheia de estrelas, sem nuvens. Noite clara, cheia de luzes e sirenes. Noite das luzes vermelhas da viatura policial e do barulho das sirenes da ambulância.
Passava da meia-noite, o sono não vinha. Ouvi barulhos de rádio comunicador e me aproximei da janela.
Da vista da minha janela, observei duas viaturas da polícia militar e quatro guardas fardados, questionando um casal que acabava de descer de um veículo.
Enquanto dois policiais revistavam o carro, outro checava o documento do rapaz e um quarto questionava a moça.
Encontraram duas mochilas no porta-malas do carro e uma terceira em seu interior. Mochilas repletas de DVD’s piratas, apreensão que causou risadas entre os policiais e problemas para o rapaz magro, que agora de cabeça baixa observava sua companheira ser liberada, até perdê-la de vista, sem nenhum abraço de adeus, sem nenhum afeto.
- Tem DVD aqui que nem saiu no cinema. O cara é o rei da pirataria – disse um dos policiais. Frase suficiente para que o outro logo se pronunciasse:
- “Filho”, você está detido, entendeu? Não precisa responder mais nada até chegar à delegacia.
Encostaram o carro do rapaz na rua da frente, à espera do guincho, chamaram reforço e assim que uma terceira viatura chegou levaram o “rei da pirataria” para a delegacia.
História que me deixou pensando em quantos reis e príncipes da pirataria existem espalhados por ai e que aquele rapaz, agora cabisbaixo, não passava de um simples bobo da corte. Mas esse era apenas o início da movimentada noite.
- Ei! Rapaz, você está louco?!
Escutei a frase em alto tom e voltei à janela, ainda sem sono, e pude ver um carro quase atropelando os cones de sinalização colocados pela polícia.
Com esse motorista a tolerância foi menor e as palavras mais ásperas. Sem meia conversa o rapaz foi detido, sem nem poder explicar-se, apesar de tentar dizer que não tinha visto o aviso para parar com antecedência, porque o policial havia sinalizado bem próximo ao cone:
- Você está dizendo que eu não fiz meu trabalho direito? – gritou o policial.
- Não bicho, não foi isso que eu disse.
- Bicho?! Você sabe com quem está falando?!
- Não consegui ver ser crachá senhor.
- Isso mesmo, comigo é senhor. Você chama de bicho seus amigos e suas “negas”, eu não.
- Posso me explicar agora, senhor? Sou pai de família, trabalhador, só fiz o que o senhor pediu. Pediu para eu parar em cima do cone e eu parei.
- Você bebeu rapaz?
- Eu tomei uns goles sim senhor, mas só fiz o que o senhor pediu.
- E aonde você ia com tanta pressa?
- Ia levar meu amigo para Campinas, a gente estava trabalhando até agora.
- Trabalhando no boteco? Ia dirigir desse jeito?
O rapaz, visivelmente embriagado não teve tempo de responder, só pode observar os policiais retirarem uma caixa preta de uma das viaturas, analisar por alguns minutos o equipamento e lhe dizer:
- Você vai assoprar ou não?
- Assoprar o quê?
- O bafômetro rapaz! Presta atenção! Você vai assoprar ou não?
- E se eu não assoprar?
- Se você não assoprar vai para o Distrito Policial (DP) e o carro vai ser guinchado. Se você assoprar vai pra casa com uma multa. E ai? Vai assoprar ou não?
- Mas eu sou pai de família, trabalhador, você está sendo injusto cara! Eu preciso do carro para trabalhar.
- A pergunta é simples, você vai ou não assoprar? É só dizer sim ou não.
- Quero dar um telefonema.
- Pode guardar o bafômetro, ele não quer assoprar, encaminhem-no para o DP e chamem o guincho também – ordenou um dos policiais aos demais.
Mais um carro enfileirado na rua à espera do guincho. Depois deste outras duas motos paradas, mais um carro e revista em alguns transeuntes. Mas estas histórias eu não quis ouvir. Tentava esvaziar a mente com estas linhas para preenchê-la com um pouco de sossego, à espera não do guincho, mas do sono dos justos.
Confesso que estou farta de tanto blá-blá-blá embaixo da minha janela, principalmente porque as palavras altas, o rádio comunicador, as sirenes e os palavrões, invadem minha calma sem permissão, quase que diariamente.
Sinto-me cansada de tanta invasão. Enquanto estas pessoas invadem meu sossego, eu invado suas histórias, que são abraçadas por mim, pelo simples fato de estarem na vista da minha janela.
Sinto saudades do barulho dos pássaros e do cheiro de mato da minha terra. Onde o único “assopro” que invadia minha calma era a brisa leve que adentrava o quarto com os primeiros raios de sol...

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