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domingo, 28 de junho de 2009

Ganhei meu dia!


Hoje ganhei meu dia, o frentista do posto de gasolina disse que meus olhos eram lindos”. É assim que essa história começa. Com uma frase dita no meio de uma conversa animada, no intervalo de almoço enquanto falávamos sobre o quanto está difícil nos relacionarmos hoje em dia. O quanto tem se tornado uma árdua tarefa nos relacionarmos com o mundo, com as coisas e pessoas, seja com nossa família, amigos, conhecidos, colegas de trabalho ou com o frentista do posto de gasolina.
Ressalto, contudo, que o relacionamento aqui citado não representa loucuras e provas de amor, nem doação integral a alguém. Representa, apenas e principalmente, a doação de nós a nós mesmos. Representa a capacidade de nos dedicar não a alguém ou a alguma atividade, mas a nós mesmos. Representa a difícil e rara capacidade de abraçarmos apenas coisas que nos são essenciais e dedicar nosso tempo todo a elas.
Representa sair com os amigos quando se tem vontade, sem ter medo de ser esquecido por eles, ou ainda rotulado de desanimado ou chato, só porque você preferiu ficar em casa de moletom e meia naquele sábado frio. Representa nos emocionar com as coisas mais simples e desmerecer outras que para alguns são belas oportunidades.
Significa ainda, sorrir sozinha dentro do carro quando se escuta do frentista um elogio deste, sem malícia, e ter a certeza de que alguém olhou para você naquele dia não como a mãe, a irmã, a namorada, a esposa, a profissional, a amiga ou companheira, alguém te olhou e enxergou ali alguém comum, que anda no meio de uma multidão sem ser notada, mas nem por isso deixa de ter sua identidade e seu brilho.
Manter um relacionamento com o outro representa a doação de seu tempo, seu espaço, suas escolhas, suas companhias e porque não, seus sonhos, em prol de um amor, uma amizade ou uma afeição, quem sabe. O que quero dizer é que não basta você ter amigos hoje em dia, não basta ter um namorado, colegas e conhecidos, você precisa mantê-los.
Uma ligação, um e-mail, um aceno do outro lado da rua, um encontro, um afago ou sorriso colaboram muito para o estabelecimento deste vínculo, mas não é suficiente para eternizá-lo, até mesmo porque não acredito em coisas eternas, mesmo que muito duradouras, tudo está em constante transformação. Sua amiga de 15 anos atrás, pode continuar sendo sua amiga hoje, mas a amizade de vocês não é a mesma daquela época.
A fase adulta nos coloca num patamar de representações que nos retira a espontaneidade, a sinceridade e a coragem de fazer e dizer apenas aquilo que queremos e achamos certo. Colocamo-nos num espaço de sutilezas e troca de favores, mesmo com as pessoas que mais nos agradam, como se para manter uma relação fosse necessário algumas trocas, submissões e principalmente mudanças (muitas vezes falsas) de concepções.
A mesma amiga que me disse a frase que iniciou este texto, me disse que gostaria de assumir compromissos apenas por vontade e não por obrigação, e eu também, mas quem tem essa possibilidade hoje em dia? Um em mil, ou em um milhão?
Quem nunca acordou com aquela vontade súbita de ficar na cama o dia inteiro? Quem nunca pensou em gastar todas as economias num único dia? Quem nunca teve vontade gritar com o chefe? Quem nunca esteve em um lugar querendo estar em outro? Quem nunca pensou em sumir da cidade por alguns dias sem dizer para onde iria?
Quem já fez uma das coisas acima? Quem já fez alguma das coisas acima e não se arrependeu? Quem conquistou a liberdade por um dia?
Confesso que tenho me sentido presa, engaiolada em um mundo construído por mim, mas sem janelas. Presa nas minhas concepções e nos valores impostos por esta sociedade injusta e desigual. Presa por minha covardia de não ser livre. Presa pelo ranço tradicionalista que ainda me acompanha e me impede de experimentar coisas novas.
Primeiro o estudo, depois o trabalho, depois a constituição de família e por último suas vontades, se é que você ainda conseguirá reconhecê-las no meio de tanta dependência dos outros e do mundo. E quem disse que esta é a ordem natural das coisas? Quem disse que é preciso que todos se constituam assim? Quem disse que este é o caminho da felicidade?
Nenhum pássaro engaiolado canta feliz. Nenhum pássaro engaiolado sonha com o cheiro de frutos e flores que ele muitas vezes nem conhece. Nenhum pássaro engaiolado tem a sensibilidade de entender o elogio daquele frentista.
Ganhei meu dia, falei o que pensava por meio destas palavras. Encontrei uma fresta nesta gaiola de vidro.

domingo, 21 de junho de 2009

Supermercado é isso!


- Ah mãe! Aqui é o supermercado! Eu não quero ficar aqui! Você me enganou!
Foi essa a fala que ouvi logo que entrava no dito recinto, palavras vindas da boca de um garoto loiro, de seus 5 anos, que enquanto verbalizava sua vontade se jogava no chão e se debatia, fazendo a famosa e engraçada “birra”.
Nunca imaginei ouvir isso da boca de uma criança, lembro que quando era criança adorava ir ao supermercado com minha mãe, claro que tinha dias, principalmente nas “compras de mês”, que tinha vontade de voltar para casa depois de ter andado por todas as fileiras e, já estar com as pernas doendo naquela fila imensa. Mas no geral, gostava de ir às compras, e olha que naquela época nem existiam hipermercados, mas a parte de doces e guloseimas já me bastava.
Foi por isso que me impressionei com a atitude do garoto, que parecia ter sido levado para a cadeira de dentista ao invés de uma doceria. Talvez porque ele soubesse bem as estranhezas daquele lugar, e mais ainda, talvez por já ter presenciado muitas vezes as reações adversas que aquele lugar provoca nas pessoas. Eu já havia presenciado tais cenas, mas nada como hoje.
Segunda-feira, dia repleto de obrigações, cobranças, readaptação à rotina e aquela vontade de chegar logo em casa, tomar um banho longo e dormir, contudo, é o dia em que você, depois de ter adiado o final de semana inteiro, já não pode mais deixar faltar o detergente na pia e o arroz na despensa, então, no final da tarde você ainda precisa ir ao supermercado.
Como outras dezenas de pessoas que ali estavam, perambulei por algumas prateleiras com uma cestinha na mão e a lista de compras na outra, pois, tinha lido em uma revista que a melhor maneira de se fazer economia é levar a lista feita nas compras, assim, você consome só o que está realmente precisando. Tudo bem que o quindim não estava na lista, mas me fez lembrar o real motivo do porque gostava de ir às compras e não resisti a saboreá-lo.
Mas enfim, compras feitas, hora do caixa. Fila à vista, claro. Dirigi-me ao caixa rápido, onde uma placa bem visível indicava: no máximo 10 volumes. Mas creio que além de mim, poucas pessoas respeitam placas, em todos os guichês, bem mais de 10 produtos e aquela morosidade. Mas quem espera sempre alcança e comigo não seria diferente,
Na minha frente uma senhora que decidiu, não sei por que motivo, comprar uma coleira, justamente hoje. Pode ser que o cachorro dela tenha fugido no final de semana ou ainda que ela o tivesse comprado bem no domingo e precisava urgente daquela coleira, o real motivo não sei, mas sei que ela me atrasou uns longos 15 minutos.
A tal coleira, vermelha de couro, estava sem o código de barras. Ao se deparar com o produto, o caixa, um rapaz de uns 20 anos aproximadamente, corou, deu uma respirada funda e acionou um botão que fez uma luz se acender bem em cima da sua cabeça. Não, ele não teve uma idéia brilhante, estava no aguardo do fiscal para indicar-lhe o preço. Aliás, deixo aqui uma crítica construtiva aos donos de supermercado, não é a primeira vez que me deparo com uma situação desta, acho que todos os caixas deveriam ter uma listagem com os códigos, especialmente destes produtos quase esquecidos nas prateleiras, que acabam por ter a cola da etiqueta vencida e ficam sem os preços.
Mas enfim, não bastasse a espera, ainda tive que ficar escutando um senhor, bem atrás de mim na fila, dizendo o tempo inteiro em alto e bom som:
- A mulher foi buscar o preço na fábrica?!
Eu olhei para ele, dei um leve sorriso e me virei. Enfim ela chegou e eu pude passar minhas compras. Nove produtos, quase cinqüenta reais, a sensação de estar sendo assaltada e logo “Murphy” reaparece:
- Senhora, o sistema caiu, gostaria de pagar em dinheiro?
- Sinto muito rapaz, só trouxe o cartão, vou ter que aguardar ou desistir da compra.
O caixa por um instante perde a cor e em seguida começa a ruborizar-se do pescoço até a ponto das orelhas.
- Vou solicitar a máquina adicional senhora, só um instante.
Perdido por perdido, decidi esperar, contudo, nem todo mundo estava com a paciência divina naquela segunda-feira, especialmente o senhor atrás de mim na fila, que quando percebeu o que havia acontecido iniciou a cena mais patética que já vi.
- Mas este supermercado é uma bosta! (Queridos leitores, perdoem o termo, mas utilizar um sinônimo ou palavra equivalente seria perder a riqueza daquele surto). Que porcaria! Vocês não servem para nada!
Gritou, gritou e repetiu as frases por umas três vezes pelo menos, até que no ápice da sua loucura, abriu os braços deixando cair todos os produtos que levava, sapateou em cima dos pacotes e saiu, tão vermelho quanto o caixa, que agora já havia corado até a testa.
Senti-me no filme “Um dia de fúria” e logo em seguida no seriado “Chaves”, vendo o seu Madruga pisotear o chapéu. Fiquei constrangida, mas não tanto quanto o rapaz do caixa. Agachei-me, recolhi alguns produtos que ainda estavam inteiros, passei meu cartão na nova máquina que acabava de chegar, ao mesmo tempo em que a moça da limpeza se aproximava, e fui para casa.
Cheguei com aquela sensação de estranhamento, sem definição de sentimentos. Esquisita apenas. Fui tirando os produtos da sacola e logo me lembrei do garoto na entrada do supermercado. Agora entendo o porquê da “birra” daquele garoto.
Estamos propícios a enlouquecer dia e noite, rodeados pelo caos, pelo estresse da rotina, do trabalho, do marasmo. Não culpo aquele homem, mas a partir de hoje me policio, evito as filas de supermercado, entro neste local com a mesma angústia do garoto loiro, de 5 anos, afinal, qualquer pessoa é capaz de enlouquecer, mesmo com as melhores e mais inocentes intenções.

domingo, 7 de junho de 2009

O rio amarelo



Em um reino muito distante existiam duas famílias muito diferentes que reinavam cada qual em seu espaço, separadas por um rio amarelo. Não se comunicavam, não sabiam a cor nem o odor do outro lado do rio. A vida era calma, cada qual fazia o que achava certo, divertia-se a sua maneira e assim a vida ia passando.
A família que vivia do lado direito do rio conservava pelos campos floridos muitas árvores e rios de águas límpidas, o céu era sempre azul, com o pôr-do-sol mais belo que já se viu. As pessoas adoravam deitar na relva e observar os pássaros que viviam livres, agradeciam dia-a-dia por tanta beleza. As crianças brincavam nos jardins, jogavam bola e soltavam pipa em dias de brisa fresca.
Do outro lado do rio os campos existiam também, mas serviam para o plantio de cana-de-açúcar ou pastagem de gado, as flores eram raras. Os rios eram largos, já não tinham peixes e cheiravam mal, mas abasteciam grandes indústrias que tornavam este lado do rio muito rico. As crianças quando desenhavam na escola pintavam o céu de cinza, afinal, céu azul só do lado direito do rio e lá elas nunca tinham ido, nem sabiam que cor era essa, aliás, poucas cores pintavam as casas e a vida desses moradores.
Em uma tarde fresca de verão a filha mais nova da família do lado direito do rio estava perambulando pelos limites do seu espaço, quando observou do outro lado do rio amarelo o filho mais novo daquela família. Os dois que nunca haviam se visto se olharam profundamente, a garota sentou-se na margem com os pés no rio amarelo e o garoto sentou-se à sua frente, olhavam-se incessantemente, tentando matar aquela absurda curiosidade, quantas diferenças, pensavam, foi então que ela disse:
- Olá, qual seu nome?
- Olá! Sou Romeu Poluição e você?
- Sou Julieta Todo Ambiente, você mora ai?
- Sim, moro desde que nasci. E você?
- Também, nunca sai do lado direito do rio. Você gosta de morar do outro lado?
- Gosto muito, aqui é bem divertido, cada dia há uma nova invenção tecnológica, uma nova comida, um novo perfume, hoje mesmo ganhei um novo jogo. E você gosta do lado direito?
- Sim, gosto muito, as flores nascem cada dia com uma cor, as árvores ganham novas folhas a cada primavera e eu adoro correr pelos campos, brincar, cantar, mas do que mais gosto mesmo é de uma pipa!
- Pipa? O que é isso? É de comer?
- Você não conhece uma pipa? É um brinquedo, você pode fazê-lo da cor que quiser e levá-lo até o céu, como se fosse um pássaro.
- Nossa! Parece bem legal, posso ver?
- Claro, vou buscar a minha preferida e já volto.
Julieta Todo Ambiente correu para casa e escolheu sua pipa preferida, era toda colorida, no céu parecia uma borboleta, levou também uma outra, afinal, soltar pipa com um amigo era bem mais divertido. Chegou até o rio amarelo e levou sua pipa para o alto de uma montanha, soltou a linha e veio correndo, chegando à beira do rio gritava irradiante ao novo amigo para que olhasse no céu.
Romeu Poluição ficou encantado com o que vira, nunca havia visto tantas cores, nem um céu tão azul, chegou a sentir um cheiro estranho, mas muito agradável que mais tarde veio saber que era de rosas de um campo ali próximo. Romeu Poluição sorriu, admirou-se com tanta beleza, sentiu uma paz tão grande e pensou: "que vontade de sentir-me assim para sempre!".
- Julieta Todo Ambiente será que posso tentar?
- Claro! Trouxe uma pipa para você! Venha para o lado direito do rio, aqui temos bons ventos!
- Será que devo? Meu pai sempre me proibiu de atravessar o rio amarelo, disse que sua família considerava a minha uma maldição!
- Já ouvi essa história também, mas que maldição um garoto como você poderia nos trazer? Você agora é meu amigo!
- Está bem!
É um, é dois, é três e já! Romeu Poluição deu um salto bem grande e atravessou o rio amarelo, apaixonado por toda aquela cor, pelo brilho do céu e pela luz dos olhos de Julieta Todo Ambiente.
Naquele mesmo instante o rio amarelo se secou, juntando os dois lados do reino, a família Poluição passou a freqüentar com grande periodicidade o espaço dos Todo Ambiente. As famílias nunca se entenderam muito bem, mas acabaram acostumando-se com a presença dos vizinhos. Um dia era uma árvore cortada ali, uma fumaça aqui, um campo de flores desfeito por plantações acolá e assim o reino foi se transformando, em nome desse amor proibido entre Romeu e Julieta.
Desde então a Poluição faz parte da vida de Todo Ambiente. O triste desta história é que com o passar dos anos, Romeu Poluição esqueceu-se do que lhe causara amor, esqueceu-se das cores, da brisa e do céu azul. Precisa, agora, ser lembrado do que lhe despertou paz uma vez na vida, para que possa educar com sabedoria seus trigêmeos com Julieta Todo Ambiente: os garotos Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente, e a garotinha Responsabilidade Social.
O problema é que ele está muito confuso com tantas mudanças, talvez precise de ajuda para salvar este relacionamento e neste caso, em briga de marido e mulher se mete a colher sim. Dar uma nova cor a este casamento depende tanto de mim quanto de você. E então? Vamos pensar em uma forma de tornar este casamento sustentável?