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sábado, 21 de fevereiro de 2009

A cidade das lembranças


Não costumo assistir televisão, não sou de acompanhar noticiário, nem novela, muito menos minissérie. Creio que perdemos muito tempo quando sentamos em frente à televisão e esquecemos do resto do mundo. Mas quando se mora sozinha, chega uma hora em que você já ouviu todas as músicas que queria ouvir, cansou-se de ficar horas na frente do computador fazendo seja lá o que for, já ligou para sua mãe, suas amigas e o silêncio começa a incomodar, é , então, a hora de ligar a tv.
Sou do tipo de telespectadora que fica trocando de canais, o tempo todo, em busca de comerciais. Sim, isso mesmo, não troco de canal na hora do comercial, troco de canal em busca de comerciais. Acho que a parte mais interessante da televisão são suas propagandas.
Sou fanática por comerciais, assisto todos e procuro na internet curiosidades sobre suas gravações. E tem muita gente que não gosta, mas na verdade acho que é porque não conseguem observar, prestar atenção aos seus detalhes. É claro que comercial de supermercado só é bom para saber onde economizar e não tem lá muita graça, mas existem alguns que me fazem pensar.
Ultimamente poderia citar uma série deles, e cogitei inclusive a possibilidade de comentar alguns comerciais neste espaço, mas hoje me prendo a apenas um.
Chamou-me a atenção pela fotografia, pela música – que me lembra muito um dos meus filmes prediletos, pela roupa dos figurantes, pelos detalhes, mas principalmente pelo texto: “Essa é a cidade da lembrança. A minha cidade. Um lugar onde ninguém se esquece de nada. Esse é o prefeito, ele não esquece o nome de nenhum morador, sabia? Essa garçonete não esquece o prato preferido de nenhum cliente da lanchonete. Os taxistas da cidade da lembrança sabem onde todo mundo mora. Aqui, até os animais nunca esquecem o que aprendem, e o elefante é o símbolo da nossa cidade...”.
O narrador do texto, um menino de seus doze anos fala com orgulho das características de sua cidade, como se lembrar-se de todos os acontecimentos, pessoas e coisas fosse a melhor coisa do mundo. Eu não entendi assim. Vieram-me outros tipos de pensamentos e sensações que agora compartilho com vocês.
Creio que muitos de nós temos boas coisas para recordar, mas com certeza inúmeras coisas a esquecer ou simplesmente não resgatar do fundo do baú de memórias. Pensando assim, imagino o quanto deva ser difícil morar nesta cidade, que felizmente, é só imaginária.
Pense em todos os erros do seu passado, em todas as vezes que deixou de perdoar e ser perdoado, em todas as vezes que se feriu e sentiu dor, em todas as pessoas que perdeu e nas lembranças que te fazem chorar, pense no gosto amargo daquela comida exótica e nas vezes que já se sentiu ridículo na frente de outras pessoas. Assim como as boas coisas, todas essas também seriam lembradas, não é?
E as contas que evitou pagar, fingindo-se esquecer, e as promessas que fez e deixou de cumprir, e aquela pessoa que você jurou esquecer para sempre, tudo isso seria lembrado. Acho que quem fez esse comercial não pensou nisso e muitas pessoas certamente não observaram a realidade por este ângulo, mas se a intenção do propagandista era me animar, me motivar a levantar do sofá e fazer minha inscrição em um curso de inglês, ele não conseguiu.
Diria que, no mínimo, esse comercial me angustiou. Cheguei a imaginar como seria viver nessa “cidade das lembranças” e senti medo. Tantas dores apagadas, tantos rostos esquecidos, tudo seria revivido o tempo todo, todo o tempo.
Tempo. Acho que aqui está o segredo. Na cidade das lembranças o tempo não deve existir. Sem tempo as pessoas não se magoam, não se julgam, mas também não se conhecem. Sem tempo todos os cheiros e gostos são os mesmos e não há do que discordar. Sem tempo não há do que esquecer, nem o que curar, tudo segue, ali, como sempre foi.
Ainda prefiro o tempo e seus ponteiros que cortam o espaço para nos amparar e nos reerguer, não sei quanto a vocês, mas de lembranças me chegam as do meu baú de recordações que guardo com muito cuidado, uma cidade cheinha delas, creio que seria aterrorizante demais. Ou não.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

"Bons ventos para nós..."


Dentre inúmeras coisas que gosto de fazer, existe uma que me agrada de forma singular, é ela que me leva a direcionar muitas de minhas ações, controlar meus sentimentos, pensar, encontrar respostas para muitas perguntas e inspiração para escrever.
Adoro observar. Observo tudo e o tempo todo. Procuro olhar cada acontecimento com os olhos da alma e isso me dá a chance de conseguir ouvir uma conversa no ônibus e fazer com que isso se transforme em uma lição de vida, ou olhar um hidrante jorrando água e fazer disso poesia.
De tanto observar as coisas simples, não me surpreendo quando mesmo com os olhos fechados consigo descrever minuciosamente qual a cor do céu, a sensação de brisa fresca, o formato das nuvens que escondiam o sol e até mesmo os pássaros e flores vistas ao longo do dia.
Foi observando que comecei a me dar conta do quanto dou importância a coisas sem importância. Confuso? Pode parecer, mas não é. Tenho passado por uma fase bem complicada ultimamente, com muitas mudanças, e não é que reclame das mudanças, pelo contrário, não gosto é de rotina, mas muitas mudanças ao mesmo tempo me fazem desacreditar do meu poder de decisão e isso me deixa insegura.
É como se em um piscar de olhos a vida te lembrasse do quanto você é insignificante. E por mais que você queira viajar nas férias, ou comprar um carro ou ainda mudar de cidade, você não vai conseguir isso de forma tão simples. Eis que surgem os obstáculos e muitas vezes não os compreendemos.
Ainda hoje, depois de um mês dos encarrilhados acontecimentos tento entender o porquê de tudo isso, e como não encontrei nenhuma resposta pronta, me limitei a observar. Confesso que o empurrão crucial para esta atitude partiu de minha mãe. Depois de me ouvir lamuriar no telefone por quase uma hora ela soltou a sábia frase: “Pare de reclamar, você tem saúde, tem um bom emprego, logo tudo se ajeita”.
Não, eu não me calei. Naquele momento só queria colo e ainda tive a tola coragem de retrucar: “Mas não é porque eu tenho isso tudo que eu preciso me sentir realizada, tenho o direito de querer mais, de acreditar em coisas melhores”.
Ela não retrucou e eu, bem, eu me senti uma idiota. Foi, então, que comecei a olhar os meus problemas com outros olhos, foi ai que comecei a observar mais, ouvir mais, falar pouco e reclamar bem menos.
Ainda acho que não preciso me contentar com o que tenho e que tenho todo o direito de buscar coisas melhores, mas havia me esquecido de agradecer. Agradecer minha vida, minha saúde, minha família, meus amigos que tornam aquele monte de problemas, meramente insignificantes.
Acho que o maior problema está em nossas mentes, que não aceitam as contrariedades da vida. Acho ainda que se aceitássemos os acontecimentos tudo se resolveria de forma bem mais simples.
Parei de reclamar, não me lamento tanto, continuo tentando buscar soluções, e o segredo é não perder a esperança, afinal, dizem por ai que cedo ou tarde tudo segue bem. Concordei com essa afirmação no dia seguinte ao diálogo com minha mãe, após presenciar um acontecimento no mínimo intrigante.
No caminho para o trabalho, observei um pássaro chocar-se com o vidro do ônibus, bem ao meu lado. A sensação foi de que se não tivesse o vidro ele teria entrado pelo meu ouvido, mas tendo ali aquela barreira transparente tive a certeza de que ele havia morrido.
Qual não foi minha surpresa quando o vi voar rente ao ônibus uma vez mais e bater asas para longe dali, desta vez em sentido contrário ao que fazia quando se chocou com o ônibus, comigo e com os meus sentimentos.
Percebi então, que muitas, mas muitas vezes é preciso cair, bater a cabeça, se esborrachar, para depois parar, respirar bem fundo, levantar as asas e buscar coragem para redirecionar seu caminho...
Creio que esta seja uma tarefa muito complicada, e que para o pássaro provavelmente tenha sido bem fácil, talvez por não se importar com os olhos de pena dos passageiros, ou ainda, com o pensamento de que ele não iria conseguir. Talvez por seguir apenas seu instinto e lutar por sua sobrevivência, ou quem sabe por acreditar que ainda valia a pena um novo bater de asas, um novo fôlego, mais um suspiro.
Independente de suas razões, aquele pássaro me fez pensar, e mais, me fez acreditar que, realmente, logo tudo se ajeita, pois, se ele conseguiu, eu também consigo e você também, e todos aqueles que ainda acreditam que vale a pena dar uma nova chance ao destino e viver todos os dias intensamente, mesmo que para isso seja necessário, em alguns momentos, voar para bem longe...

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Bozo sim senhor!


Era sexta-feira, a última do mês, marcada por ser um dia repleto de obrigações, fechamentos, relatórios e visitas inusitadas. Uma sexta-feira que mesmo não sendo treze, mostrou-se atípica desde seu início. Na volta do trabalho, outro acontecimento estranho. Ele sentou-se ao meu lado, e as banalidades nos levaram a falar sobre o final de semana. Ter recebido um número de telefone e um desafio enquanto ele descia do ônibus e se despedia afoito seria apenas o início das estranhezas deste dia.
- Costuma sair muito aqui?
- Saía mais, agora estou mais caseira, mas de sexta-feira é sagrado.
- Hoje vai sair então?
- Com certeza.
- Aqui está.
- O que é isso?
- O número do meu telefone, tem coragem de me ligar?
- Por que não?
- Quero só ver.
O conheço a pouco mais de um mês, trabalhamos em prédios próximos, viajamos no mesmo ônibus todos os dias, nem sempre nos sentamos juntos, na verdade geralmente as conversas resumem-se a um “bom dia” ou “ainda bem que já é sexta-feira”. Desta vez conversamos um pouco mais e recebi esse desafio, logo eu que vivo desafiando o destino, não deixaria passar a oportunidade de conhecê-lo um pouco mais.
Liguei e fui convidada para ir a um jantar que ele não sabia onde seria, nem com quem, convite negado, ele decidiu juntar-se a mim e a meus amigos. Encontramo-nos e decidimos o destino da noite.
A primeira opção estava fechada, de lá nos dirigimos a outro local, mais uma mudança de planos e enfim o bar.
Éramos cinco pessoas. Três mulheres, um homem e o Bozo. Não, este não é o apelido dele, nem indica alguma característica física. Ele simplesmente é o cara mais engraçado que já conheci.
Apesar de dizer-se tímido, fez piada com todo mundo, apresentou-se, enturmou-se e fez com que déssemos grandes gargalhadas. Piadas não faltaram e intromissões nas nossas conversas também não, tudo ia muito bem até o momento em que ele colocou uma batata frita no nariz. Foi, então, que tive a certeza de estar sentada ao lado do Bozo.
Ele ali, com a batata no nariz continuou conversando com meus amigos e tomando cerveja, algum tempo depois a batata se foi, mas o Bozo não.
Não conseguia acreditar que podia existir alguém tão engraçado e simpático, ainda mais nesta cidade esquisita, onde as pessoas não se misturam e adoram julgar pelas aparências. Mas é claro que essas surpresas boas geralmente têm data prevista para acabar, ainda mais comigo.
Algumas cervejas a mais fizeram o Bozo transformar-se no Sérgio Malandro. Foi então que percebi que tinha caído em mais uma pegadinha de Santo Antônio, que com certeza é afim de mim.
Procurei pelas câmeras escondidas e já começava a ouvir: ”Rá-rá! Salsi-fu-fu! É pegadinha do Malandro!”, quando decidi voltar para minha realidade e para casa, afinal, brigar com um bêbado e com idéias machistas nunca valeu a pena:
- Você não vai me dar um beijo?
- Não.
- E por que não?
- Chamei você para sair comigo e com meus amigos para nos conhecermos, isso não quer dizer que vou beijar você, as coisas não são assim.
- Não acredito que eu deixei de ir no jantar com meu amigo, para vir aqui com você e você vai me ignorar.
- Sinto muito se você acha que perdeu seu tempo, estávamos nos divertindo com você, e achei que você também estava gostando de estar aqui, mas se não está é melhor ir.
- Não acredito que você vai fazer isso comigo
- Sabe o que não suporto em vocês?
- Em nós?
- É, nos homens. Vocês sempre precisam de algo em troca. A companhia, uma boa conversa, o estar presente não basta, sempre precisa ter algo mais para ter valido a pena. Isso é ridículo!
- Você está me chamando de ridículo?
- Não, você é que está se ridicularizando.
Não encontrei as câmeras, mas tive certeza que estaria nas telas do programa Silvio Santos no próximo domingo. No dia seguinte ele me ligou e perguntou o que havia acontecido, falou que estava de ressaca e com amnésia.
A amnésia é uma boa desculpa para esconder a ressaca moral, mas tudo bem, eu já tinha visto e escutado o suficiente, já estava satisfeita e não perderia meu tempo relembrando aquela tola conversa.
Creio que as conversas no ônibus, provavelmente, serão resumidas a um “olá” ou “até amanhã”. Uma pena, pois fazia tempo que um homem não me fazia rir tanto e tão espontaneamente...