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terça-feira, 23 de março de 2010

Sem assunto...


Acabo de ligar para minha irmã. Não, ela não disse nada, nem atendeu. Na verdade nem eu teria muito assunto a tratar com ela, afinal faz tanto tempo que não a vejo e não somos lá muito íntimas, mas me deu vontade de ligar.
Não sei por quê, mas hoje queria ter falado com ela. Falar o quê?! Ah, sei lá, talvez nada. Nossas conversas não são muito longas. Mas pelo menos dizer um oi, como você está, essas coisas.
Perguntar do trabalho e da pós dela, mesmo sem esperar que ela retorne a pergunta. Saber se ela ainda está namorando e se montou um consultório, trocou o carro ou decidiu casar. Essas coisas que a gente deve saber sobre os irmãos, entende?
Mas ela não atendeu, então deixa para outro dia. Não, não tentei uma vez só, insisti várias vezes. Em casa umas três vezes pelo menos e outra no celular. Aposto que minha mãe quando chegar vai ver a ligação e me ligar achando que aconteceu alguma coisa, mas hoje só queria mesmo era falar com a minha irmã.
Tenho pensado bastante nela essa semana. Sempre penso em todo mundo de casa, é estranho não saber o que sua família está fazendo, se estão bem ou não, se estão rindo ou chorando, se assistiram o último capítulo da novela ou tomaram chuva no final da tarde. Essas coisas que a gente faz quando mora junto com a família, coisas que agente fica sabendo sem precisar perguntar, já que acompanha tudo.
Essas coisinhas, do tipo café com açúcar ou adoçante, bife ou frango, gelatina ou sorvete, enfim... Pequenas coisas, do dia a dia que te deixam tão próximo, mas tão próximo que te colocam dentro da vida de cada membro da sua família. Você sabe o que cada um jantou, que horas saiu e chegou, que roupa vestiu e o sapato que calçou.
E quando a gente se afasta, isso tudo, que era tão comum, torna-se alheio a nova rotina. No máximo consigo imaginar o que acontece por lá, mas tudo, tudinho, não isso eu já não sei. Até por que os pais têm a mania de nos poupar dos piores problemas, na verdade acho que essa é uma tática de família, também não conto todos meus pormenores para não acharem que estou enlouquecendo, mas é assim, se soubéssemos de tudo, tudinho, não conseguiríamos tocar a vida do lado de cá, tão longe e com a cabeça lá, perto deles e dos seus problemas.
Mas a distância não impede a saudade, pelo contrário, a provoca. Ainda há a vontade de fazer parte daquela rotina e para isso eu mando e-mail, ligo, às vezes recebo até cartas do meu pai. Mas têm dias que minha irmã não atende o telefone, ou minha mãe vê a ligação tarde demais.
Na verdade o que queria dizer é que queria ter falado com minha irmã hoje. Acho que é saudade. Se pudesse iria agora mesmo para lá e me jogaria na cama dela dizendo: Oi irmaaã! Logo em seguida lhe daria um beijo na bochecha (que ela detesta), só para ouvi-la dizer: Pára Taline!
Ia então olhar bem para ela e sorrir. Esse é o nosso diálogo mais frequente, um diálogo quase mudo, sem assunto, mas que significa tanto, tanto quanto o telefonema que ela não pode atender.
Nostalgia. Essa pequenina palavra tem consumido meus dias e as poucas horas que tenho reservo para me revigorar. Tenho me dado o direito de relembrar boas coisas do presente passado e isso tem me dado mais força, mais fôlego. Diria que tem diminuído a distância e aumentado a saudade.
Que coisa estranha... Não sou muito de dizer isso, mas caramba, que saudade da minha irmã!
Ilustração de: Gabriel Vicente.

domingo, 14 de março de 2010

Tolos multiplicadores de tempo


"A globalização não é apenas palavra da moda (...). Suas dimensões básicas, que estão revolucionando a atividade produtiva e o modo de vida neste fim de milênio, são a aceleração do tempo e a integração do espaço. O paradoxo é que embora façamos as coisas que desejamos em cada vez menos tempo, falte também cada vez mais tempo para fazer aquilo que desejamos. Quanto mais economizamos tempo, mais carecemos dele” (GIANNETTI DA FONSECA, Eduardo).

Aquela história de aceleração do tempo me deixou bastante aflita. Confesso que já me preocupava em excesso com a organização e o aproveitamento do meu tempo e que depois deste milionésimo de segundo a menos senti a necessidade de analisar minha vida inserida na relação espaço e tempo.
Calma. Não farei nenhuma análise científica, muito menos me atreverei a falar de física, até porque nunca fui uma boa aluna nesta matéria. Até hoje não consigo entender muitas das fórmulas apresentadas em sala de aula e me basta saber que ao conseguir calcular inconscientemente a possibilidade de atravessar uma rua, sem ser atropelada, já estou utilizando de cálculos da física.
Peço licença para utilizar alguns exemplos da minha vida para ilustrar esta reflexão e mais, peço que tentem incluir seus exemplos no decorrer deste texto, pois só assim poderemos realizar uma reflexão coletiva.
Tenho passado por dias angustiantes, que se desenrolam em uma única questão: o que fizeram com as minhas 24 horas do dia?
A sensação de que o dia já foi e que nem metade da lista de tarefas foi cumprida é opressora, angustiante e diria mais, torturante.
Para entender essa angústia precisei listar todas as atividades realizadas diariamente e então ficou fácil saber para onde as 24 horas foram.
Dedico-me atualmente ao cargo de assistente social em um setor público, que raramente me permite o cumprimento de apenas 6 horas diárias, estipuladas no edital do concurso, adicionam-se as 2 horas diárias no transporte público e lá se foram 8 horas.
Além disso, preciso estudar para atender a minha teimosia de realizar duas pós-graduações simultâneas. Considerando que não tenho pique diário para a leitura de livros científicos, quando não estou estudando me dedico a pesquisas na internet e outras distrações. Estudo e computador consomem aproximadamente 3 das minhas horas restantes, e lá se foram 11 horas.
Faço questão ainda de passar pelo menos 1 hora do dia lendo o jornal local e pesquisando notícias curiosas do Brasil e do mundo que servirão de inspiração para a coluna da semana, soma-se ai mais 1 hora de elaboração e revisão dos textos, e lá se foram 13 horas do meu dia.
Há que se considerar que eu preciso me alimentar pelo menos três vezes ao dia, e que cada refeição exige tempo de preparo e de louças limpas, assim lá se foram mais 3 horas, computando 16 horas!
Lembrando que, com a conquista das mulheres no último século, tive a oportunidade de me tornar independente financeiramente e morar sozinha. Para tanto, pensando na manutenção da minha saúde, do meu nome e da minha casa torna-se indispensável encarar filas de banco e sessões de fonoterapia, discutir com a atendente da NET, trocar a lâmpada da sala, além das habituais tarefas designadas historicamente às mulheres: limpar a casa, lavar e passar roupa e fazer pelo menos uma sobremesa por semana. Dividindo estas tarefas em dias diria que lá se foram pelo menos mais 2 horas, totalizando 18.
Como ninguém é de ferro também gosto de ir ao cinema, sair com meu namorado, visitar minha família, cuidar da minha tartaruga ou ficar estendida no chão da sala escutando música sem pensar em nada. Confesso que tem sobrado pouco tempo para essas atividades, mas em termos, poderia dizer que dedico outras 2 horas diárias a esses prazeres, e enfim 20 horas!
Infelizmente ainda não sou um ser extremamente desenvolvido e necessito do sono para repor as baterias, deste modo, quando o raro silêncio da rua me permite utilizo minhas últimas 4 horas do dia para descansar.
Depois de fazer e refazer estes cálculos percebi que tenho dedicado muitas horas a coisas que podem ser importantes para outras pessoas, mas não são tão importantes para mim.
Lembro-me que quando me instalei nesta cidade, passei 8 meses me dedicando apenas ao trabalho e viajei com freqüência, conheci novas cidades e culturas, sai aos finais de semana, fiz muitos amigos, experimentei novos sabores, fui a peças de teatro e a shows em praças públicas, mas um insistente sussurro vivia dizendo que eu precisava me dedicar a outras atividades.
Não demorou muito para arrumar um outro emprego e fazer uma dupla jornada de trabalho e tão logo saí de lá iniciei uma pós-graduação e seis meses depois a outra. E hoje, olhando para isso tudo me sinto envergonhada por perguntar para onde foram minhas 24 horas.
Eu as consumi! E não da forma mais prazerosa ou mais rentável, as consumi multiplicando minhas tarefas, com a falsa ilusão de que assim conseguiria multiplicar o tempo. A verdade é que GIANNETTI está correto, “quanto mais economizamos tempo, mais carecemos dele”. Carecemos de tempo para subdividi-lo ao atendimento de nossas múltiplas tarefas.
O fato é que quanto mais atividades temos, mais querermos ter, numa enganosa impressão de que o tempo irá multiplicar-se para atender nossos ditames. Quão tolos somos! A humanidade adora brincar de Deus e tem arriscado até multiplicar o tempo na última década.
Gostaria de ter a percepção, e de que esta fosse coletiva, do resultado de tanta correria, pois ao avaliar ponto a ponto do meu dia, percebi que tenho tido pouco tempo para cuidar de mim e das pessoas de quem eu gosto, e isso tudo para agradar ao futuro, que pode apresentar-se promissor, mas que não me dá garantias.
A única certeza que tenho agora, a única garantia que é palpável é que o tempo não para e cabe a mim, e a você dentro da sua rotina, não multiplicá-lo, mas consumi-lo com as melhores coisas desta vida, é isso que faz o tempo render, é isso e nada mais!

Ilustração de: Gabriel Vicente.

domingo, 7 de março de 2010

O dia em que a Terra acelerou...

Li no jornal desta semana que os dias na Terra ficaram mais curtos desde a madrugada do último sábado. Logo pensei no horário de verão e achei que poderia existir alguma relação com o escurecer mais breve e a menor quantidade de horas claras para se dedicar aos afazeres cotidianos.

Mas ao continuar a leitura da manchete, não demorou muito para me surpreender com a notícia de que os dias mais curtos são uma consequência do terremoto que devastou o Chile na última semana. Os cálculos, feitos por um Laboratório da NASA, indicam que os dias ficaram 1,26 microssegundos mais curtos.

Considerando que os dias terrestres possuem cerca de 86.400 segundos, pode parecer pouco, ou quase nada. Contudo, o fato de pensar que a força de um terremoto é capaz de acelerar ou reduzir a rotação da Terra, tornando os dias mais curtos ou mais longos de acordo com a redistribuição da massa do planeta após seu tremor, me deixou tensa.

Quando era criança estudei sobre o movimento de rotação e translação da Terra, mas ninguém me disse que isso era passível de mudança... Aliás, sempre imaginei que a Terra estivesse “presa” em um eixo imaginário, seguindo seu ritmo rotineiramente a fim de nos garantir nossos dias e noites.

E agora essa novidade... Novidade que para muitos não passou de mais uma manchete sem sentido e que pouco ou nada impressionou, mas que me fez pensar em algumas coisas

Como é possível um tremor no Chile acelerar os dias da humanidade inteira? A quem devemos “cobrar” esse milionésimo de segundo que nos foi tirado? Será que os atrasos no trabalho poderão ser justificados com a aceleração da Terra daqui por diante? Chego a imaginar como serão as desculpas em um futuro breve:

- Desculpe chefe, é que o planeta acelerou na madrugada passada e eu não acertei meu relógio.

- Estava marcada para antes do tremor, mas acabei me atrapalhando com a aceleração da Terra.

Dias atrás estava preocupada com o fim do planeta, com medo de que o mundo acabasse em água ou coisa assim, mas hoje vejo que não é nada difícil a Terra sair “rodando” por ai, depois de um tremor daqueles. Imagine que loucura, o planeta rodopiando como uma bola de gude pelo espaço?

Claro que estou exagerando, mas imaginar os dias mais curtos, mesmo que com uma mudança quase imperceptível na relação tempo-espaço, me faz aumentar ainda mais minha cobrança sobre minhas certezas. Sobre de que modo tenho aproveitado meus dias, meus milionésimos de segundo e que mundo estou construindo para a nova geração.

Terremotos, enchentes, calor excessivo, nevascas, as pessoas tem morrido de desastres naturais hoje em dia. Não se fala mais de morte por velhice ou acidente de trânsito, quiçá de câncer ou AIDS. Nos noticiários os índices de mortalidade apresentados são causas de efeitos da natureza, isso é o que podemos chamar de “morte natural”.

É bem possível que com tanto espaço na mídia, em breve existirão “empreendedores” utilizando-se da desgraça alheia para lucrar. Do mesmo modo que já ouvi dizer que turistas de outros países pagam para fazer um tour pelas favelas cariocas, não me assustarei se em breve aparecerem anúncios do tipo: Conheça um tornado de perto! Ou: Venha viver a emoção de um terremoto! Ou ainda: Faça seu passeio de bote na marginal (coletes inclusos).

Brincadeiras à parte, o fato é que frequentemente direcionamos nossa energia para coisas que em pouco tempo deixam de ter sentido. Aproveitamos os dias (curtos ou não) com pouca intensidade, valorizamos negócios que prejudicam nossa existência, pouco nos importamos com mudanças que afetam a humanidade.

Que tipo esquisito nos tornamos... As crianças são bem mais interessantes que nós. A “adultescência” nos faz perder alguns dos valores mais interessantes desta vida. Por essas e outras, que se fosse possível gostaria de desacelerar não só a Terra, mas também o tempo, com tanta intensidade que retornaria para a calmaria dos meus cinco anos, onde a Terra não saia do eixo, muito menos a humanidade.

Ilustração de: Gabriel Vicente.